quarta-feira, 21 de setembro de 2011

Viva Paulo Freire, patrono da Educação do Distrito Federal!


Discurso da viúva de Paulo Freire, Ana Maria Araújo Freire, na sessão solene da Câmara Legislativa do Distrito Federal, de 19 de setembro de 2011, que outorgou o título de patrono da Educação do Distrito Federal ao grande educador brasileiro. 

Exmo. Sr. Deputado Patrício,
Presidente da Câmara Legislativa do Distrito Federal -

Prof. Dr. Venício Lima, meu amigo, brasiliense por opção, que hoje e aqui, em data tão significativa relança seu livro Comunicação e Cultura: As Idéias de Paulo Freire -

Autoridade presentes -

Professores e professoras -


Realmente exulto de alegria e de emoções outras por ter sido convidada para estar presente na Casa que representa o povo da Capital da República brasileira, no momento em que ela outorga a meu marido Paulo Freire, in memória,o título inédito de Patrono da Educação do Distrito Federal.

Ao ter acatado a proposta do Presidente da Casa e por estar esta nomeação se tornando públicano dia em que Paulo completaria 90 anos de vida, exatamente acontecendo na cidade que o consagrou no mundo como o criador de um Método de alfabetização revolucionário --- pois, foi aqui, que, em 1963 ele experimentou o que faria em nível nacional, a partir de 1964, infelizmente impedido de realizar seu ousado projeto pelo Golpe Militar – que tinha como objetivo alfabetizar o povo brasileiroresgatando a sua cidadania, o seu amor próprio, é motivo de regozijo para todos nós.

Brasília é, portanto, tanto quanto o Recife e Angicos no RN, um espaço emblemático aonde os oprimidos e analfabetos, objetos da subserviência e exploração dos dominadores seriam conscientizados e assim teriam a possibilidade de se fazerem sujeitos também da história.

Esta festa de hoje é significativa por todos estes motivos e me alegra particularmente que isto esteja acontecendo a partir do fato, que divulguei no Prefácio que eu mesma escrevi para o livro de Venicio Lima, hoje aqui lançado ao público:

 “Quando, ainda em 2010, coloquei no pé da minha página de cartas da internet: “2011 Ano Comemorativo dos 90 anos de Nascimento de Paulo Freire.”, tinha a intenção, obviamente, de mobilizar estudiosos e amigos  de meu marido adizerem a sua palavra sobre ele.

Frase simples e sincera foi a minha intenção de provocar nos verdadeiros freireanos a vontade e a responsabilidade de pensar e de sentir sobre a importância e a grandeza de Paulo. Quer pelos afetos generosos que ele distribuiu em profusão como parte de seu sentimento mais profundo de amorosidade e de comunicabilidade “molhadas” nas suas emoções como parte da sua existência humana mais autêntica, nunca negados, mas sempre aprofundados até o último dia de sua vida; quer pela sua enorme capacidade de nos fazer pensar. Pensar no outro e na outra com o outro e a outra, germe de sua compreensão doexistenciar-se humano e, portanto da comunicabilidade e de sua preocupação com a comunicação como diálogo para transformar o mundo.

A cada manifestação de alguma universidade, de alguma ONG de adesão ao meu “convite” de dividir comigo a alegria da presença de Paulo no mundo, meu sentimento de solidariedade e admiração por meu marido aumenta --- e, felizmente continua aumentando, pois não cessam de me convidar para falar sobre ele, para ouvir sobre ele, para escrever sobre ele, enfim, para estar com ele, em várias partes do Brasil e do exterior.”

Esta homenagem de hoje por seu caráter eminentemente político, que sem dúvidaultrapassou a minha provocação, o meu “convite”, pela repercussão que terá, assim esperamos, nas escolas do Distrito Federal --- dos diretores, aos professores, coordenadores e outros agentes da educação --- coloca o Poder Legislativo, que tem o poder de ditar normas e orientações pedagógicas para a educação de sua população, em situação de atenção e de cuidado com o ato de educar sob sua jurisdição. Entendo este título como um compromisso explícito de que no Distrito Federal não se praticará a educação bancária, tradicional a serviço da perpetuação e privilégio da elite. Que a educação que se praticará aqui partindo dos princípios da teoria de seu Patrono será a educação popular que não segrega ou discrimina as crianças e os adolescentes pela classe social, pela religião ou gênero. Que há na outorga desse título ao homem que mais se preocupou com a alfabetização de seu povo --- que inclusive para isso criou um Método de Alfabetização conhecido como Método de Alfabetização Paulo Freire, a pouco mencionado --- uma deliberação para eliminar o analfabetismo no Distrito Federal.

Para a concretização desta tarefa importante que redundará na melhoria qualitativa e quantitativa do ensino no D.F. será necessária a união dos esforços da Secretaria da Educação, do Ministério da Educação, mas reafirmo, sobretudo, desta Casa que precisará legislar de forma clara e explícita para que não paire dúvidas sobre o porquê, o como, o a favor de quem e de que, o contra que e contra quem a educação se destina e se fará objetivamente.

Pela força emblemática que sabemos ter um título de Patrono da Educação cabe à Câmara do Distrito Federal, repito, criar os meios para que a educação como Paulo a compreendeu e praticou seja possível na Capital Federal. Se não houver esse empenho não se justificará o título. Esse empenho é o que dará validade ao título ora outorgado ao meu marido.

Para Paulo a educação é um ato político, ético-estético, social e crítico-antropológico e não apenas epistemológico. Assim, esperamos que este Ato suscite em todos e todas que trabalham na Rede Distrital a busca pela sua própria formação permanente enquanto agentes para a transformação social com a garantia e o aval desta Casa.

Os educadores e as educadoras desta cidade terão, portanto, o direito de cobrar desta Casa os meios legais para exercerem com proficiência e dignidade a tarefa que lhes cabe. Terão odireito de solicitar melhores salários e melhores condições de trabalho. Os vereadores desta Casa têm, a partir de hoje, o dever de cuidar da educação de seus munícipes e da formação de seus educadores dentro dos sonhos possíveis de uma educação voltada para a libertação e a autonomia de todos e de todas. Têm o dever de eliminar o analfabetismo dos que constroem a pujança e a beleza da cidade concebida por JK, Oscar Niemeyer e Lúcio Costa. Os professores e professoras têm que fazer jus à responsabilidade que assumiram ao optarem por serem educadores: terão que ser transformadores da realidade violenta e injusta partejando e ajudando a partejar um mundo melhor, mais justo, verdadeiramente democrático, como queria o seu patrono Paulo Freire.

Esta festa me faz sentir-me junto a Paulo, ao homem que amei e com o qual dividi grande parte de minha vida. Ultrapassa saber que o admiro por ser o maior educador brasileiro de todos os tempos. Esta festa faz do meu corpo um corpo consciente porque todo ele, sentir e pensar, se põe em estado de expectativa de dias mais justos e felizes para as e os brasilienses.

Assim, em meu nome e no de Paulo Freire, meu marido, o meu muito obrigada a esta Casa, de modo especial ao seu Presidente, o Deputado Patrício, pelo honroso título que agora recebo.

Viva o Patrono da Educação do Distrito Federal, o educador maior do Brasil! 
Viva Paulo Freire!!!

19 de setembro de 2011.

Ana Maria Araújo Freire, doutora em Educação pela PUC/SP, viúva e sucessora legal da obra de Paulo Freire. 

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